quarta-feira, setembro 05, 2007

Saúde!

Quando era criança, minha mãe via suas plantas amareladas e dizia que elas estavam doentes. Minhas bonecas ficavam doentes, meus pés ficavam doentes quando eu andava muito. Minha alma ficava doente quando eu ficava triste.

Povos antigos relacionavam seus mitos de criação aos sentimentos dos deuses e seus filhos, e a doença era explicada pela ausência de ligação entre o espírito e o corpo, porque ambos eram uma só coisa gerando um só resultado.

O conceito de saúde da OMS ("saúde é um estado de completo bem estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença”), mostra que a saúde é um estado, uma maneira de estar no mundo, de poder atuar enquanto humano nas dimensões da sua subjetividade. Saúde é um conceito subjetivo, portanto cultural, mutável, instável, relacional. Por isso, a saúde não pode ser construída individualmente, ela é, essencialmente, coletiva. Passa pela forma de cuidar de si e dos outros. Um exemplo? A vacinação contra a paralisia infantil. De nada adianta meu filho estar vacinado se todas as crianças não forem também, porque ele terá sido vacinado mas não imunizado. A imunização é um conceito relacional. Uma população, um grupo, uma comunidade pode ser imunizada, não apenas um indivíduo.

A saúde passa a ser um direito exatamente quando ela se perde. Basta pensar que a própria OMS é um resultado do pós-guerra. A saúde passa a ser direito quando o Estado precisa intervir para garanti-la, e só se garante algo quando se está em vias de perder esse algo.

O direito passa a ser um limite, um mínimo, aquilo que resta, o que sobra para podermos sobreviver. Cada direito que nasce não é um ganho, é uma perda. É a constatação que se extinguiu e precisamos salvar o que resta.

O artigo 196 da Constituição prevê o direito à saúde que o Estado propõe ao cidadão: ser de todos indiscriminadamente, garantido por políticas públicas com ações de promoção, proteção e recuperação, visando a redução dos riscos das doenças. Esta percepção de saúde, como foi dito acima, não é suficiente porque é a tentativa de equiparar a saúde a um direito administrativo de organização da saúde. Visto assim, é um direito redutor e insuficiente inclusive do ponto de vista da OMS.

A saúde deve ser encarada de forma abrangente e profunda, conforme determinação, constitucional de direito social e de garantia da dignidade das pessoas, e o que o Estado deve garantir (além do que já garante) é a inserção de todos a uma vida digna, com boa alimentação, lazer, salários adequados, moradia e tranqüilidade econômica, encarando tudo isso como parte da saúde da população brasileira.

4 comentários:

Anônimo disse...

Oi Andréa! Espero que esteja tudo bem contigo por aí. Muito legal o teu post. Sem saúde o indivíduo não pensa, não age, não tem autonomia. E em nosso país a saúde tende a ser cada vez mais negligenciada e negada a quem precisa. O Poder Público não funciona como deveria e o contribuinte (e aquele que não contribui, mas tb tem direito) fica sem proteção. O SUS paga pouco por consulta, e os médicos vão buscar seu sustento nas cooperativas. Aí falta remédio aqui, tratamento ali, e crescem as os pedidos de socorro ao Judiciário - muitas vezes sendo dado o que se pede pra quem nem precisa, às custas de dinheiro público. Enfim, mau gerenciamento de recursos - escassos -, dando no que se vê por aqui. Vamos melhorar nosso país! Beijos e "axé"(!)

Rita Tarifa disse...

oi déia! mtas saudades...
ao ler seu post, lembrei-me de várias pessoas morrendo em razão de doenças cardíacas e pela paralisação dos médicos que reivindicavam melhor remuneração..nao sei se vc acompanhou, há poucas semanas..

Andréa Sá disse...

Ana,
que bom que vc comentou! pois é você que é constitucionalista sabe melhor que eu o problema que gera para o dinheiro público a ausência de um bom gerenciamento da saúde. No fim, quem resolve ( e muitas vezes mal) é o judiciário...
beijão

Andréa Sá disse...

Rita,
as pessoas morrem não é por causa dos médicos que estão "em greve". Isso não é uma greve , é um alerta, porque eles não podem trabalhar sem lugar e salário dignos. É melhor sair do SUS e procurar outro emprego...é inclusive mais honesto, não acha?