terça-feira, julho 24, 2007

Pessoas confusas,direitos difusos ( Vôo JJ3054- uma cena)

O artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor diz que os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer forma de empreendimento , são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quando essenciais, contínuos.

A rigor, o transporte aéreo de um país é um serviço público prestado indiretamente, ou seja, por outra pessoa jurídica pública ou privada que não o próprio Estado, mas que está submetida à mesma obrigatoriedade como se fosse uma empresa estatal. A responsabilidade da relação jurídica de consumo estabelecida é caracterizada pelo serviço público que se está oferecendo (pelo objeto), não por quem está oferecendo (sujeito prestador).

Isso quer dizer que o serviço de transporte aéreo brasileiro está regulado não só pelas determinações do CDC, mas sobretudo pelas determinações principiológicas constitucionais pertinentes ao artigo 37: os serviços públicos deve ser eficientes, adequados, seguros e contínuos.

Os serviços são considerados eficientes se, e somente se, cumpre a finalidade para o qual ele foi criado. Só é eficiente para a Constituição Federal aquilo que funciona.

As demais qualidades que o serviço público deve apresentar estão ligadas a esta primeira. Adequado se sua disponibilidade atende às necessidades da população, seguro se há inspeção dos itens mecânicos, elétricos, etc. e contínuos se não puderem ser satisfatoriamente substituídos pela mesma qualidade, quantidade e operacionalidade. Diante disso, os transportes aéreos brasileiros estão ferindo de morte a Constituição.

Mas não é só isso.

Vejo nos jornais indicações de como os passageiros feridos em seus direitos individuais devem resgatá-los através de indenização. No entanto, o que está em jogo é mais, muito mais que indenizações individuais, ou mesmo coletivas (entendendo coletivo de pessoas que viajam ou viajaram nesses vôos onde algo deu errado). A discussão gira em torno de um coletivo nacional, difuso, sem caras, sem nomes, sem digitais. São as pessoas que estão nas ruas , trabalhando e vêem um avião cair em suas cabeças. São as pessoas que vivem do turismo, e não falo só dos donos de pousadas, mas dos vendedores de praia, dos taxistas, enfim, de todos os brasileiros que vivem o medo de avião sem necessariamente jamais terem pisado dentro de um. São também os estrangeiros, os que cruzam os céus do país, todos esses detêm um direito maior que se chama direito difuso.

Essa categoria de direito não se circunscreve a um único titular, um “dono” de um direito individual, que tenta resgatar uma dignidade ou seu prejuízo. Os valores alcançados pelos direitos difusos são de todas as pessoas que pleiteiam e tutelam não só coisas que têm valor econômico, mas também esta universalidade passível de ser pedida e resguardada, coisas como cuidado e eficiência.

Talvez seja isso que o MP de São Paulo, sendo o fiscal do cumprimento da lei e advogando em nome da sociedade, pensou ao pedir o imediato fechamento de Congonhas. Uma medida bonita, mas de desespero, porque o problema não é meramente geográfico. É uma resolução coletiva de um país que cada vez mais se vê diante de sua imagem, e cada vez mais tem vergonha do que vê.